quarta-feira, 27 de maio de 2015

História "Pra Boi Dormir".

Decolamos de Carauari, cidadezinha plantada nas margens do Juruá. Chovia muito. As freiras, as freirinhas, os padres, os índios, as índias e pajés; havia também macacos, papagaios, tartarugas, todos voando a bordo do meu valoroso Dakota C-47. Voávamos entre o rolar dos trovões...
 Mais de 40 pessoas a bordo, bem acima do previsto, mas dentro do peso normal. No coração dos Dakotas, voando pela Amazônia, sempre havia lugar “pra mais um”. Aqueles passageiros ribeirinhos é que estavam bem abaixo do peso normal.
Decolamos, nariz pra cima, chegamos aos dez mil pés.   No meio do caminho entre Carauari e Eirunepé, a cabeça de uns dos enormes cilindros voou pelos ares, quase levando a carenagem do motor esquerdo. O meu copila era um tenente novinho, R2, que fazia sua primeira viagem sobre a densa floresta amazônica. Quando ele viu o motor pegando fogo (ele estava do lado esquerdo, na posição de primeiro piloto) ficou pálido de espanto, desmaiou, dizendo que íamos morrer.  E foi bem melhor assim.  Sozinho, livre dos “conflitos de cabine”, ficamos também livres para tomar nossas decisões. Eu, pelo menos, gosto de ser assim.
Para encurtar a história: o que seria uma hora de voo transformou-se em duas horas de extremo sufoco, passageiros gritando e chorando, voando baixo, sobrevoando o Rio Juruá que é muito, mas muito sinuoso, pois, pensava eu, se o motor direito pifar, eu me jogo sobre o rio, livrando das enormes árvores, castanheiras com mais de dez “andares” de altura, rodeadas de bilhões de mosquitinhos, onças, cobras e jacarés.
Conseguimos chegar a Eirunepé já no “lusco-fusco”, quando, acredite quem quiser, fui carregado pelos ares como verdadeiro herói pelos incrédulos passageiros!
E foi só na hora do jantar oferecido pelo prefeito, que estava alegre, risonho e feliz por termos salvo sua família inteira que estava a bordo do nosso heroico C-47; e só depois de tomar um copo bem generoso da “branquinha”, foi que senti minhas pernas tremerem, lembrando da minha mulher e dos meus filhos ainda pequenos  que  deviam estar em casa, em Belém do Pará, alegres e brincando, sem desconfiarem de nada.

Quem escapa de um perigo, ama a vida com máxima intensidade...
Coronel Maciel.

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